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imagem/Milton Dacosta Daquela cerca de ripas
Memoriais de Sofia/Zocha
Hoje lembrei da cerca de ripas da casa da rua Goiás Não sei por que também me fez lembrar a fechadura do portão naturalmente das goelas das bocas de leão cor de vinho dos mosquinhos do jardim de dona Sofia e dos olhos fundos nascidos nas covas frágeis de Floramy Não sei porque lembro-me daquela barrenta rua para pegar o ônibus dos botecos onde se compra salsicho para o almoço da geladeira Clímax Vitória quantas vezes vazia do capilé e do Qsuco para o dolé das luas de queijos da casa paroquial daquelas poltronas de pèzinho fino como sapatilhas dançando na sala vazia... do vaso quebrado atrás da porta do televisor Empire que pegava mal do chuvisqueiro daquela tela preto e branco do riso miudinho da parteira dona Margarida do tom de azul escuro da cozinha pintada a óleo dos ruídos do amor no quarto da frente quando meu pai chegava de viagem da couve manteiga que ela plantava e colhia e cortava bem fininha e depois fazia refogadinha para ele Não sei porque me lembrei daquela cerca de ripas ponteaguda do piso encerado de vermelhão da pequena área das minhas tranças que cresciam rápidas dos fios dos novelos de lã da venda do Rufino alinhavando essas dores sem tempo Já espetei o dedo mas não consigo despregar os olhos daquela cerca de ripas da pereira carregada de flores do sorriso amarelado de Leontcho do outro lado da rua calçado de chinelos sobre a calçada de cimento branco e debruçado sobre seu portão de ripas/ele não fica dependurado na cerca como o Dirceu polaco com tantas estórias mal contadas...
Hoje eu gostaria de ficar embrulhada entre os crivos das blusas de cambraia de Zocha naquele branco límpido cristalino sem carimbos No alvejado algodão do divino deus da minha infância de pontos bordados com fios de barbante um a um dedilhados como sonoras notas de uma acústica de anjos ainda não trincada por não abrir a porta a quem não deve Queria ficar nessa brancura de asas sentar-me no beiral do vento e uivar-lhe essa criança flanando branca borboleta a assustar as portas abertas a estremecer as janelas fechadas a desafiar a revoada de olhos d´ água quando se perdem pelo céu em busca de alvuras perdidas
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Lilian Reinhardt
Enviado por Lilian Reinhardt em 30/11/2010
Alterado em 01/12/2010
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